PRINCESAS PERDIDAS

Dina Goldstein polemiza ao fazer uma releitura das princesas dos contos de fadas utilizando a fotografia.

Publicado em: 24/04/2013
Uma Rapunzel careca, uma Chapeuzinho Vermelho obesa e uma Pequena Sereia presa em um aquário. É assim que a fotógrafa israelense Dina Goldstein imagina as cultuadas personagens infantis ao se depararem com os vícios e as mazelas da contemporaneidade. A série de fotos Fallen Princess, publicada na internet sem muita pretensão em 2009, fez com que blogs e sites do mundo inteiro divulgassem o interessante e provocativo trabalho de Dina.



“O ‘felizes para sempre’ é substituído por uma situação realista que mostra problemas atuais”, explica a artista, que começou a se interessar pela magia das personagens de contos de fadas observando o encanto de sua filha Jordan por figuras como Jasmine, Cinderela e Ariel. “Jordan conhece muito bem meu trabalho. Embora não entenda muito bem o que acontece nas fotos, ela reconhece os personagens. E me pergunta por que o rosto da Bela está sendo puxado e por que ela está sangrando. Eu explico que Bela está ficando velha e que precisa de alguns tratamentos para permanecer bonita. Eu falo a verdade”, conta Dina.



Dina, que atualmente mora em Vancouver, no Canadá, possui um extenso currículo como fotógrafa editorial e comercial. Já ganhou prêmios de revistas como Photo Life Magazine e Applied Arts Magazine. A série Fallen Princess começou como um projeto pessoal e acabou alavancando a carreira da fotógrafa em nível internacional. O conceito de princesas irreais vivendo situações reais poderá inclusive se transformar em um seriado de televisão.    
“Com um orçamento limitado, eu comecei a produzir essa série, incorporando muitos detalhes importantes em cada imagem. Publiquei as fotos na internet para ter algum feedback, mas não tinha nenhuma ideia do que iria acontecer em seguida. Centenas de blogs de todo o mundo reproduziram meu trabalho. Meu site ficou sobrecarregado devido aos acessos e eu recebi diversos e-mails me parabenizando”, explica.  
Ao contrário das princesas dos contos de fadas, as princesas de Dina Goldstein são reais e foram encontradas nas mais variadas situações. A fotógrafa conheceu Heather Rupert, que encarnou Branca de Neve, em um casamento. Natalie Marrable, que se transformou em Cinderela, foi descoberta trabalhando como recepcionista em um restaurante.



Esta visão crítica dos contos imaculados de outrora tornou-se uma vertente mais popular desde que a DreamWorks estreou o filme Shrek, 2001. Todo o enredo mostra personagens consagrados por suas histórias cheias de pureza e inocência com algumas sutilezas sarcásticas. Exemplo disso são o príncipe e princesa ogros, o cavalo branco que é na verdade um burro falante e a fada madrinha que faz maldades para conquistar cada vez mais poder no reino encantado. Estas características sarcásticas podem passar despercebidas para crianças sem senso crítico desenvolvido, porém cria uma veia cômica mais ácida para os adultos e até mesmo forçam os pequenos a terem um outro olhar em relação a estes contos.
Nada mais coerente com o mundo de hoje que busca a transparência total, no qual a tecnologia tenta escancar toda a verdade. Situações fantasiosas e lúdicas perdem cada vez mais o espaço para uma visão mais real de como o mundo e as pessoas realmente são. Estes elementos podem ser um prato cheio para quem quer questionar esse romantismo, que até pouco tempo era usado como mantra na educação do imaginário infantil, servindo de esteio muitas vezes como matérias escolares para um público de até a alfabetização.



Muito mais que um trabalho artístico, esta série de fotos de Dina é um questionamento aos modelos de vida pregados pelo difundido american way of life, baseado na busca constante pela juventude, beleza, dinheiro e prazer. Talvez por isso, as fotos rodaram o mundo rapidamente e ganharam tamanha proporção, pois tocam no calcanhar de aquiles desta cultura. Este consumo desenfreado, que é motivo de chacota para o resto do mundo, parece ser não só ignorado, mas cada vez mais incentivado no mundo ocidental, e posições como a da fotógrafa trazem à tona o ridículo e também discussões sobre este modo de vida.


Fotos: Dina Goldstein

Como alvo dessas discussões e questionamentos, estão os retratos da Chapeuzinho Vermelho e Jasmine, considerados os mais polêmicos. O primeiro insinua uma crítica ao nocivo modo de vida atual, repleto de fast-foods e comidas industrializadas. O segundo foi interpretado por parte do público como uma referência às mulheres terroristas. Dina nega qualquer ofensa ou preconceito em suas fotos. “Houve muita controvérsia e discussão sobre algumas imagens. Eu agradeço qualquer interpretação do meu trabalho, embora eu não concorde com a maioria”, completa a artista.